Naquela manhã o sol raiou glorioso nos céus de Washington D.C. Na West Wing da Casa Branca, o presidente dos Estados Unidos após reunir com o chief of staff, terminava uns flocos de aveia, lançando um frango de borracha a estimular os reflexos de Bo, o presidencial cão de água português. Teria um dia agitado, reuniões sobre o novo projecto de criação de empregos, a visita de líderes do Congresso e a recepção ao recente primeiro-ministro português preenchiam a manhã. As coisas andavam complicadas para a Administração Obama, com o desemprego a não ceder e os bastards da Moody’s a desafiar o sacrossanto triplo AAA do rating. Ao primeiro-ministro português, um político em apuros no seu país, reservara vinte minutos, a sublinhar a condição de “amigo” e “aliado” na “NATO alliance”, o adido de imprensa lembrava-o para elogiar os “delicious” pastéis de Belém que o presidente Silva lhe oferecera durante a visita a Lisboa, no ano passado.
Com olheiras, atormentado pelos problemas do défice, agora agravado pelas diabruras da Madeira, Passos Coelho após as fotos e aperto de mão da praxe, uma vez no sofá da Sala Oval, onde entrava pela primeira vez, foi direito ao assunto, num inglês límpido, recortado pela sua voz de barítono, melhor fora ter feito carreira por aí, lamentava às vezes com Laura, no aconchego do T3 de Massamá:
-Senhor Presidente, é importante o empurrão que o seu governo possa dar junto da chanceler Angela Merkel. Ela não ouve ninguém, ainda a tentei convencer cantando-lhe “Una Furtiva Lacrima” ao ouvido, mas aquilo é um Panzer sem coração. O Berlusconi é que tem razão, se estivesse sexualmente mais, digamos… amparada… talvez amolecesse o coração e ajudasse com eurobonds para o peru do Natal…
Obama sorriu, pondo a mão por cima do desafortunado chefe do governo. Oferecendo um Toblerone, que Passos aceitou, guloso, aventou uma sugestão:
-Pedro, tem de ter paciência. Aqui nos States também tenho problemas com algumas mulheres: a Palin, por exemplo, e a Michelle, em casa, anda sequiosa, não posso sair da Sala Oval que me agarra pelos cantos, é confrangedor, com os serviços secretos sempre a ver tudo. Olhe, cada vez que me lança um olhar lânguido, dou-lhe um Toblerone destes, e mando-a com as miúdas visitar o Mandela ou a comer um Big Mac.Ainda para mais, deu-lhe para achar que tenho uma Levinsky, uma moça do Harlém que anda aí a tirar fotocopias.
Um secretário, pedindo licença para interromper, avisava que tinha Papandreou, o chefe do governo grego do outro lado. Após minutos, durante os quais Passos Coelho aproveitou para fotografar a Casa Branca com o telemóvel, Obama voltou, confidenciando ao português:
-Era o George. Vinha propor-nos a venda de sete ilhas no mar Egeu, no Dodecaneso, 40% de desconto na compra imediata, e a ilha de Patmos de oferta, para mim e Michelle. Fiquei de pensar. Malyia precisa de praia, e as águas são terrific.
Passos aproveitou a deixa e lançou a escada para uma proposta ousada:
-Barack, lá por isso, também temos ilhas fantásticas, e bem mais perto. A Madeira, por exemplo, clima tropical e vegetação luxuriante…
-Madeira? Isso não fica no norte de África?
-Sim, mas é tudo nosso, europeu. A troco da nossa dívida à troika, poderíamos vender-vos a Madeira. E dávamos Porto Santo de bónus, para levar amigos de férias a jogar golfe!.
Obama coçou o queixo e chamou Timothy Geitner, o secretário do Tesouro, que, feitas as contas, achou o negócio interessante, acordando-se logo um contrato promessa de compra e venda. Para evitar chatices com o Eurogrupo, seria tudo em dinheiro vivo, ao país, amargurado e desde Washington, o primeiro-ministro falava em “construir o futuro” e num “novo paradigma de Nação” bem como num prazo de 50 anos em que o português vigoraria como língua de trabalho, assim como se fizera com Macau. Jardim, na Quinta da Vigia, bufava, praguejando e esmurrando uma foto de Passos, só uma injecção com concentrado de poncha o acalmou, deixando a dormir por dois dias.
Dois meses depois, Passos Coelho, com fato novo e trauteando o La Donna e mobile, comparecia em mais um Conselho Europeu. Rigoroso, desaconselhava apoios aos despesistas gregos, sugerindo a sua saída do euro, ao lado dos da linha dura. Merkel, derrotada em todas as eleições via-se perdida em relatórios do hiperbólico Barroso, que falava sem parar e sem dizer nada. Magnânimo, Passos ofereceu-lhe um Toblerone, piscando o olho a Berlusconi, depois do jantar curtiriam a noite de Bruxelas, Silvio conhecia um bar bem guarnecido perto do Grand Sablon, sem esquerdistas nem gordas.A dívida fora saldada, e grandes investimentos chegavam agora em catadupa, relançando a economia nacional, amigo, Portugal oferecia-se para comprar dívida grega a 80% a 2 anos, Vítor Gaspar fora mesmo enviado a ministrar um curso de finanças tântricas.
Enquanto isso, numa cadeira de praia num resort de luxo no Lido, escutando o mp3, o presidente dos Estados Unidos tirava uns dias de férias no mais recente estado americano, o 52º, enquanto um assessor lhe mostrava como funcionava um artefacto local designado bailinho, depois de passado a pente fino pelas secretas. A stars and stripes flutuava ondulante em toda a ilha, pululando casas de espetadas, agora designadas como maderan barbecue, um Disney World estava já planeado para o Machico e uma sequela do Avatar para o Chão da Lagoa. Divertido junto à piscina, Bo brincava correndo e roendo um chapéu de palha que pertencera ao antigo chefe do governo local, agora a viver nas Canárias, onde à noite fazia biscates de stand-up-comedy num café concerto em Tenerife. Tudo está bem quando acaba bem.