por F. Morais Gomes

31
Jan 11

Paciente e sem pressas, Hélder de Bragança empacotava livros e papéis na biblioteca da casa de Verão, o presépio  branco das Azenhas ali ao lado, com a velha casa vendida recolhia -se agora ao remanso de Linda-a-Velha. Um neto dado às letras e admirador daquele avô escritor viera ajudar à mudança e clinicamente observava o mundo de mundos empilhados naqueles papeis amarelecidos, “as minhas páginas amarelas”, ironizava o velho escriba, mais de cinquenta anos esgravatando poesia e prosa, o testamento vital duma vida de paixões, medos e fantasmas, de Luz.

Hélder de Bragança, pseudónimo literário de Jorge Soares, arquitecto de formação mas desde cedo dedicado às letras, companheiro de Ramos Rosa e Herberto Hélder  nos anos da juventude, armazenava agora o espólio de uma vida vertida em muitas letras, muitas manuscritas, defuntas de passados vários Ainda escrevia, e, sinal dos tempos, a custo aventurava-se no asséptico Word em Arial 12 que tanto o irritava.

-Escrever sem caneta é como escrever com preservativo, João- comentava com o neto, fã daqueles velhos textos e da vasta biblioteca-sarcófago de conhecimentos por descobrir e outros já revelados- a caneta permite-te escrever fazendo amor, pulsar, caminhar ofegante ao encontro da ejaculação das letras, os dedos acompanhando a mente rumo ao orgasmo transpirado!. Escrever é como fazer um electrocardiograma à alma, a emoção a domesticar a razão, mas onde ao contrário da vida, a arritmia liberta e a normalidade mata, lentamente! – teorizava, enquanto  num saco enfiava originais do Ramos Rosa, escritos no miradouro da Graça quarenta anos antes, recordava relendo, grande jantarada nesse dia a zurzir no Cesariny.

João, barba negra hirsuta e densa, também ele aventurado nas letras na finitude dos seus vinte e três anos, ouvia e registava, empilhando livros  junto à lareira, o Almada, o velho rafeiro cheirando em volta, comida ali só espiritual. Aventurando-se entre a escrita e a música electrónica, com amigos ensaiara já um livro de poesia, edição de autor, " Profanação da Onirotragédia”, roteiro em torno dos sonhos que não recordamos, que sonhámos mas o subconsciente censurou, explicava ao avô, leitor interessado. Pela escrita lutava contra essa censura, pela escrita aventurava-se na mea culpa de viver com máscara, a escrita, inimputável, a desmascarar verdades não confessadas.

-O escritor - ia desfiando o experimentado avô, vasta cabeleira branca em desalinho, resquício de estimação dos loucos anos sessenta exilado em França- é um correio: uma vez vertida a alma no papel- confessionário, envia-a definitivamente ao seu destino, como um origami dos sentidos. Nenhum escritor pode dizer eu quis dizer isto ou aquilo quando quem lê, com o seu olhar pessoal e maculado por uma história de vida pessoal e única aí captar algo diferente. A obra literária, uma vez escrita, parte definitivamente ao seu destino, e quem a capta, como ave solta ou segredo desvendado dá-lhe a leitura que aí encontrar, e só a sua. O receptor lê muitas vezes algo distante do que o autor quis dizer, mas esse é o fascínio da literatura! -teorizava, lembrando o seu livro mais conseguido que só vendera quinhentos exemplares, e o “Ultimato da Alma” que detestara e lhe dera um prémio, ironia do destino. -Contudo nada atenua o facto de que cada escritor é um tirano entrincheirado nas suas verdades. O leitor pode descobrir algo diferente, mas só ele leva para o túmulo o segredo do enigma da palavra escrita!

João entusiasmado com a conversa perorava sobre o assunto, os livros espalhados pela mesa e sofás testemunhavam:

-Hoje o que se lê tem muito a ver com hedonismos, avô, os escritores são vaidosos mas sem coragem de assumir a vaidade, todos escrevem para si mas na prática quando sabem que vão editar, o verdadeiro Eu perde algo de Eu, é o Eu que querem que os outros vejam, não o Eu transparente e nu. Não achas que há nisso uma fraude intelectual, capturando os leitores para os livros a ler e não para os livros verdadeiramente escritos?

Hélder/Jorge  tentava-se a responder como Hélder mas a finitude do momento, a alma franca do neto, alter ego e cúmplice, amainou-lhe a resposta, ser escritor é ser polémico, sempre o achara, mas à pergunta do neto, no labirinto de pulsões pensadas ,respondia como Jorge, ortónimo daquele Hélder fingidor, antes fulgente e astral, agora, com a idade, burocrata da palavra:

-Os anos gastam as palavras, João. Quantos sonhos, loucuras, vontades, se escrevem aos vinte anos e relidos aos setenta se revelam lancinantemente estranhos, distantes, glaciares, por vezes levando a pensar:terei eu escrito isto ? Só há um segredo: quando chegares aos setenta anos e o jogo das palavras te for familiar e te convide livre de fantasmas para a Grande Viagem dos Sentidos como quando eras ingénuo escrevinhador em guardanapos de café, aí reencontraste o teu destino e voltaste ao teu ponto de partida!

A conversa pedia já um Jameson sem gelo, João serviu dois copos e interrompendo a arrumação dos caixotes sentavam-se agora no varandim com vista para as Azenhas, o Presépio Branco açoitado pelo mar irado.

Mais tarde,  continuando o avô a ensacar anos de letras a caminho duma cave em Linda a Velha, onde famélicos ratos aprenderiam as primeiras letras, João sentou-se frente ao portátil ,ainda envolto naquele cheiro a papel velho, as “páginas amarelas” do avô, e tentou registar pensamentos. Jorge, ainda acabando o Jameson, surgiu-lhe à porta do quarto e sorriu, irónico:

-Como é possível escrever com um ecrã de vidro luminoso e frio por testemunha? – arengou.-A escrita é um pacto cúmplice entre caneta e papel, não um duelo de dedos nervosos esgrimindo contra um electrodoméstico com teclas. O Rabaça tem razão, quem vai ler daqui por cem anos coisas registadas num vidro com néon? Falta alma!- e desceu para a biblioteca já esvaziada, duas caixas levavam agora desenhos de Júlio Pomar, o safardana roubara-lhe a Manuela quando alunos de Belas Artes, nunca lhe perdoara, guardava ainda os esboços a lápis, um livro de Sebastião da Gama ficava para o neto.

Procurava João reter para memória futura os desabafos do avô quando no ecrã do portátil uma irritante mensagem alertava para bateria fraca, deitando por terra o propósito. No piso de baixo, bramindo uma cúmplice caneta fora de moda , Jorge , de novo Hélder de Bragança ,desabafava com um papel o derradeiro texto na casa com vista para o Presépio Branco.


publicado por Fernando Morais Gomes às 10:49

30
Jan 11

Fim de tarde em Sintra, o cadenciado matraquear das bolas na mesa de snooker acompanhava as animadas tertúlias  no discreto bar do Sabot. Clientes disputando uma partida ou jovens da geração recibo verde, anónimos ou velhos conhecidos, no Sabot corriam soltas as conversas abrilhantadas por litros de ávidas imperiais que conduziam sempre à salvação do mundo pelo fim da tarde, depois da enérgica utilização do verbo e antes do previsível e recuperador bife com cogumelos. Rafael, Rafa para os amigos apreciava a tranquilidade do local para garatujar letras para canções, viera cedo, Adriano, funcionário das finanças , chegava pelas seis como de costume, com a sala ainda tranquila, naquele dia particularmente zangado com a notícia da retirada de competências às câmaras despesistas, a crise a justificar a medida, um dia a crise a justificar a democracia, reclamava, uma imperial era urgente, antes que aumentasse o preço, irritado com a cultura de laxismo, personagem em busca de guião na Sintra de 2011.

-Isto só lá vai com a independência! Já vistes que Sintra tem mais população que a Madeira e os Açores juntos? - comentava ao balcão com o Zé, sorvendo a primeira cerveja dum trago  – e temos tudo para isso, já viste?

O Rafa, embrenhado nos seus poemas, sorriu da mesa do canto e pediu um café, alheado, política não era com ele. O Raposo Taxista chegava entretanto para uma fresquinha, o Adriano continuava na arenga elevando o tom da voz, a sala mais composta era garantia de audiências, que  a pátria salva-se sempre primeiro nos cafés.

-Pois vejam bem, temos castelos, saída para o mar, aeroporto na Granja, indústrias, tribunal, turismo…-ia debitando, uma imaginária bandeira independentista passando pela vista a esvoaçar no Castelo dos Mouros, tortuosas teorias da conspiração galvanizando o insurrecto estudante entre duas partidas de snooker no bar e mais uma imperial fresquinha.

O Raposo concordava, mas o essencial era sair do euro:

-Tem toda a razão amigo, por este andar daqui a cinco anos estamos todos a comer ervas. Deu-se cabo da agricultura, indústria não há… e a malta nova, andam a tirar cursos para trabalhar em supermercados ou roubar. Não sei onde é que isto vai parar!

Adriano começava a juntar apoios enquanto o Zé aviava mais uma rodada, agora já com amendoins, para enxugar, lá fora mais um comboio saía para o Rossio. O revolucionário das seis da tarde continuava:

-Saía-se do euro e fazia-se uma zona franca em Sintra, um paraíso fiscal, um cluster de industrias criativas, davam-se isenções fiscais às  empresas ecologicamente eficientes e universidade gratuita, paga com as receitas da zona franca, iam ver, em dez anos éramos a Suíça da Europa- continuava, naif, o desejo de mudar o mundo dos outros quando não se consegue mudar o próprio. O Rafa, já contagiado pela ideia do cluster criativo interrompeu a escrita no bloco azul e juntou-se-lhes, dois adeptos já estavam convertidos, pelo andar à meia-noite a Rádio Ocidente anunciaria um golpe de Estado e a secessão de Sintra, micro-estado sem exército, maior que o Mónaco ou o Luxemburgo .

O Raposo Taxista insistia na questão do euro, já a quarta imperial inaugurava o caminho da goela, havia que tomar medidas:

-Eles vão ver aonde vai levar esta política. Vejam uma coisa: um país sem moeda e sem agricultura  está sempre dependente dos outros. E o que é que a gente produz? Nada! Até as batatas vêm de Espanha, é uma vergonha!

-Claro!- acicatava o Adriano - se isto fosse independente apoiava-se fortemente a agricultura! A maçã reineta, as hortas de Almargem, o vinho de Colares…

-Ah, isso sim, boa pinga sim senhor! - atalhou logo um dos jogadores de snooker, até ali calado, debruçado sobre a mesa, distraído tocara numa bola não branca com o taco.

-Então mas onde é que eram os limites do tal país?- sondou o Zé, anuindo, servindo uma tosta mista  ao Rafa.

-Para mim era assim: toda a zona rural, no máximo até Mem Martins . Já viram que daí para lá só há problemas? Além do mais está tudo construído, não trás receitas, é um fardo em despesas de saúde, educação, há os bairros sociais e os imigrantes. E os IMI’s não rendem tanto assim, que as pessoas não pagam...-rematava, estava tudo estudado, até o acordo ortográfico devia ser revisto.

A conversa fluía e a noite caía rápido, os dois do snooker saíram pensando serem todos malucos, voltariam mais tarde, os conspiradores levados pelo entusiasmo cantavam já canções patrióticas devidamente ilustradas com canecas de cerveja e brindes à revolução, à independência e até a José Mourinho.

Já a revolução estava em marcha,tocou o telefone,a voz furiosa e alterada da mulher  do Adriano do lado de lá  obrigava a mudança de planos, o frango para o jantar nunca mais chegava e ainda tinha de passear o cão. Obediente, lá saiu correndo, adiando o golpe de estado para a tarde seguinte. Com uns tremoços a acompanhar, se possível.


publicado por Fernando Morais Gomes às 10:02

29
Jan 11

A tarde caía fresca na penumbra das frondosas árvores, no improvisado camarim da Regaleira actores e técnicos agitavam-se para a estreia de Hamlet, toda a família Tapafuros em azáfama para mais uma temporada, os pesadelos do príncipe de Elsinore  no palco da Quinta Mágica.

Em noite cacimbada, vento irritante mas familiar (se  tem saudades do Inverno passe o Verão em Sintra) Rui Mário, seguro, mestre, dava instruções, o teatro feito verbo, atento a detalhes e lembrando marcações enquanto a um canto Pedro Hilário, ao relento, testava o  som no terreiro, absorto revendo as músicas minimais com que ilustraria o desassossego em som. Já vestido e maquilhado, Samuel , o Hamlet de Sintra, relia o texto uma derradeira vez, muita merda, haviam desejado a Rute e o João Vicente, pela noite a Lua Cheia fecunda bafejaria mulheres com uma hora pequenina, a peça prateada ao luar também entraria em trabalho de parto. À porta, na bilheteira e com o conforto de casa cheia, Marco desdobrava-se recebendo convidados,  os amigos ,cúmplices  viriam para um  copo no fim da noite. Um percalço: um jovem actor, nervoso com a estreia ,tivera uma "branca", o Olavo substituiria, sabia o texto.

Rui Mário  seria desta vez o fantasma, invisível voz na noite escura, do além conduzindo os títeres mortais em valsa lenta. Ao jantar no Culto bebera um vigorante tinto, qual guerreiro antes da batalha, ortónimo de fantasmas vários, da vida, de vidas, fingidor sem falsidade.No camarim, com  Samuel  a verificação das marcações, a colocação da voz,o guião uma vez mais relido:

-"Que velhaco sou eu, que vil escravo! Pois não será monstruoso? Este actor pôde, numa simples ficção, num sonho apenas de paixão, forçar a alma aos seus preceitos, a ponto de fugir-lhe a cor do rosto, marejarem-lhe os olhos, o conspecto confundir-se-lhe, a voz tornar-se trémula, e toda a compostura conformar-se às suas influências?" -repetiam, o texto em  confissão, a confissão em texto, olhar no espelho onde Samuel era Hamlet e Hamlet era o mundo.

O silêncio invadia a noite na casa do Grande Alquimista.Começada a função, a pantomina das máscaras  desfilava o seu jogo de sombras, Sintra-Elsinore, Dinamarca em Cynthia, a pequenez e grandeza dos homens, convocando-os para o desvendar das fragilidades que o truão de Stratford-Upon-Avon desnudara, temido dos poderosos, mordaz porta-voz dos sem voz. Os jovens actores do Resistências debutavam, como há vinte anos outros o haviam feito, tapando furos das aulas, iniciáticos militantes do teatro.Um deles como discreto escudeiro no Pátio das Quimeras, outros dois silenciosos cortesãos na corte de Cláudio, rei indigno, no palco do mundo muitos Cláudios  primeiras figuras na pérfida récita da traição.Rui Mário acompanhava, tutelar e o primeiro acto fluía, o público bebendo silencioso as palavras ditas, Rui letárgico repetindo-as, sentidas:

-“Oh, se esta carne sólida, tão sólida, se desfizesse, fundindo-se em orvalho! Ou se ao menos o Eterno não houvesse condenado o suicídio! Ó Deus! Ó Deus! Como se me afiguram fastidiosas, fúteis e vãs as coisas deste mundo! Que horror! Jardim inculto em que só medram ervas daninhas, cheio só das coisas mais rudes e grosseiras”

Atento, Marco registava em vídeo, como produtor profissional e eficaz guiava Paula Moura Pinheiro que assistia, prometera uma notícia no Câmara Clara.No canto superior da bancada ,amigos dos Tapas escutavam em silêncio, o Pignatelli, a Cláudia Faria , o Fernando.No fim ,na tasca do Samuel se daria o bálsamo às gargantas boémias após a estreia,no primeiro dia do resto daquele Verão.

-Cada peça encenada é sempre um libelo de resistência- comentava o Rui para o Jorge Menezes- fazer teatro hoje é ter a sobriedade de ser louco, mas sem loucura corre-se o risco de ficar doido- rematava, sorrindo, o criador olhando a criatura, Jorge, aconchegando o cachecol , concordava com a cabeça, só os Tapas o  arrancavam do exílio em Fontanelas.

A peça caminhava para  o perturbador clímax  que o dramático enredo tecera, profético, inquieta a sonoridade do Hilário, na bancada expectante antevia-se  a tragédia, sempre renovada e fatal. Já Samuel segurava o crânio do bobo Yourik, finitude do Ser prostrado convidando à reflexão e  no confessionário da Regaleira-Mundo se incensava a Vida, abúlica e trágica nas angustiadas palavras que gerações de actores renovaram no mágico e catártico momento do Grande Teatro do Homem:

- "Ser ou não ser... Eis a questão. Que é mais nobre para a alma: suportar os dardos e arremessos do fado sempre adverso, ou armar-se contra um mar de desventuras e dar-lhes fim tentando resistir-lhes? Morrer... dormir... mais nada... Imaginar que um sono põe remate aos sofrimentos do coração e aos golpes infinitos que constituem a natural herança da carne, é solução para almejar-se…"

A assistência bebia cada palavra, no breu da noite, druida junto ao carvalho, Rui Mário, de olhos fechados e sorrindo deixava cair o pano imaginário, Príncipe da Dinamarca no  orvalho de Sintra desfiando o resto do texto na solidão do recinto cheio:

- "Morrer… dormir... dormir... Talvez sonhar... É aí que bate o ponto. O não sabermos que sonhos poderá trazer o sono da morte, quando enfim desenrolarmos toda a meada mortal, nos põe suspensos. É essa ideia que torna verdadeira calamidade a vida assim tão longa! Pois quem suportaria o escárnio e os golpes do mundo, as injustiças dos mais fortes, os maus-tratos dos tolos, a agonia do amor não retribuído, as leis amorosas, a implicância dos chefes e o desprezo da inépcia contra o mérito paciente, se estivesse em suas mãos obter sossego com um punhal?"


publicado por Fernando Morais Gomes às 12:21

28
Jan 11

Era tensa a atmosfera à chegada ao aeroporto do Cairo. Fernando Rodrigues, jornalista free lancer propusera ao Correio Diplomático uma reportagem sobre a turbulência no Magreb, depois da Tunísia era agora o Egipto a fazer manchetes,um acordo com o editor e chegava para cobrir os eventos.Regateado o táxi, a visão matinal da megapólis de vinte milhões de almas aparentemente transmitia tranquilidade, cartazes de Mubarak destacados,o bulício anárquico e ruidoso dos soukhs. Ashaki,a jornalista que conhecera em Gaza na altura do cerco ao Hamas esperava-o, arranjara-lhe um hotel simpático depois da conversa no Skype.

Ashaki mostrava-se exultante. Com vinte e sete anos, nunca conhecera outro governo  no seu país senão o de Mubarak, um regime fechado , o apoio americano como seguro de vida, jovens em luta por emprego e liberdade a destapar agora a panela de pressão no Facebook. Por SMS nova manifestação tinha sido convocada para o dia seguinte, no centro do Cairo e esperavam-se  milhares de jovens, ElBaradei chegara da Europa. Depois dum banho e de um almoço ligeiro calcorreou a cidade a pé.Na praça Tahrir vários mufis em silêncio dirigiam-se para a madrassa de Qalaun, alheios às manifestações, laicas e urbanas. Mais agitado pareceu o ambiente no  mercado Khan al-Khalili, o cheiro das shishas de vários sabores inebriando o ar, nas ruas a algazarra dos vendedores no regateio,  cobres e especiarias  serpenteando pelas vielas estreitas.Deteve-se a  fumar um cachimbo de água no El Fishawy e em inglês, lá foi socializando,tentando entender a rua árabe. Uns receosos de falar, a polícia secreta com olhos e ouvidos espalhados, mais interessados na venda de souvenirs,todos das pirâmides, os novos mais entusiastas, depois dos habituais vivas a Ronaldo, sinónimo de Portugal por aquelas bandas.

No dia seguinte,acompanhado de Ashaki, montou posto no local da manifestação, perto da  mesquita de Ibn Tulun. Sem líder ou grupo organizador, espontânea, muita polícia e repórteres estrangeiros, Cristiane Amanpour, a conhecida jornalista reportava para a Fox. Fernando com o seu cartão “Press" visível fotografava e tirava notas enquanto os manifestantes iam chegando, a pé e de metro,   milhares, o perímetro policial reforçado.Gritava-se por liberdade e democracia, muitos jovens com mp3, divorciados da velha guarda corrupta e instalada. Minutos mais tarde e já a praça transbordava, um cocktail molotov solitário atingiu um café, ocasião para a polícia intervir. Os ânimos aqueceram , Fernando captava tudo, História ao vivo e a cores, lembrava-lhe o Portugal de 1974 que não vivera. Um dos manifestantes, exaltado, tentou imolar-se pelo fogo,  Fernando, atento e em busca do exclusivo saltou para a frente a captar a foto mas a polícia perdeu a calma e desatou  a disparar. Uma bala, perdida atingiu-lhe o ombro, deitando-o por terra, Ashaki aflita logo a socorrê-lo com colegas do jornal. A turba gritava e a Fox captava imagens do jornalista português rodeado de  manifestantes irados, dano colateral em revolta alheia.

A perda de sangue e o desfalecimento levaram-no a acordar num hospital no dia seguinte ,cheiro a água oxigenada, compressa no ombro. A enfermeira sorria, vários correspondentes queriam entrevistar o homem certo no lugar errado.Assim  se faz a História, pensou, com o ombro inchado.Ashaki  chegou trazendo  flores e sumos. Fernando era jovem e bem parecido e em Gaza quase “pintara” um clima entre eles, o ombro dorido mas macio acicatava desejos. Os jornais da manhã pouco transpiravam, arruaceiros ociosos, calara a censura. Três dias depois teve alta e instalou-se na casa de Ashaki, um apartamento em Heliopólis, moderno, os pais eram abastados armadores em Suez e estudara em Paris, árabe mas emancipada.

Com o tempo e já convalescente, a rua ganhou dimensão, os americanos encorajavam as reformas, Fernando exultava e pensava como os povos  encontram sempre o seu rumo por muito anestesiados que estejam. Ashaki conseguira permissão para cobrir os eventos, cada vez mais esperançada num Egipto livre e Fernando sentia aquela terra como sua agora, irmanado numa causa nobre que a Portugal sufocado pela crise faltava e decidiu ficar uns tempos, com ela viveria dias irrepetíveis.

Algumas semanas depois, chupava uma shisha com sabor a maçã no El Fishawy ao fim da tarde, Ashaki finalmente trazia a notícia da reviravolta política, um novo governo era aclamado nas ruas  explosivas de alegria. Abraçaram-se e juntos desceram  o Nilo de felluka,  as margens plenas de festa, a libertação a passar por ali.No Egipto de 2011, a liberdade reconquistada chegava com um travo forte e doce a maçã.


publicado por Fernando Morais Gomes às 11:12

27
Jan 11

Lisboa, Novembro de 1966,a manhã cinzenta e chuvosa testemunhava o pausado embarque da companhia do alferes  Avelino Guedes rumo a Angola. Recruta em Mafra , um curso de Medicina recente ,agora  um pelotão de rudes transmontanos, infantes em armas pelo Império.Único varão do velho Dr.Sérgio, advogado em Condeixa, olhava ansioso o imenso navio e a massa castanha  e verde de soldados alinhados, a Pátria una do Minho a Timor com os olhos neles, a repelir os turras inimigos no  Ultramar. Avelino escondia o nervosismo, inseguro condutor duma trintena de mancebos, a Vera para trás a acabar o internato, invadia-o  o torpor de  sentimentos ambíguos , patriota confuso, o consultório e a noiva  adiados. No cais de Alcântara, madrinhas de guerra incentivavam os bravos com promessas de espera, a companhia de passionais aerogramas logo os confortaria na solidão do mato cálido e perigoso.

O embarque foi em silêncio, interrompido pelos gritos de mães de negro, eternas viúvas de maridos e filhos arrancados para uma guerra distante, já de luto carpindo um futuro incerto, a cadeira vazia à mesa, a cama fria sem macho, as vacas por ordenhar pela manhã. Soando o vapor a embarque, Avelino abraçou o pai, um beijo em Vera, a promessa do regresso, salvo, vivo de carne e de alma.

Até Angola foram dias de enjoo, jogos de cartas pela noite, o receio do regresso  na horizontal ,numa caixa negra  e  fria, a incerteza angustiada dum póstumo toque de silêncio. Logo um voo para Ambriz e quartel em Santo António do Zaire, a guerrilha ali ao lado, num Congo pejado de turras, catanas  e canhagulos ameaçando os colonos.

As patrulhas na picada eram silenciosas, o capim alto escondendo rastejantes nativos à tocaia do branco, as minas furtivas aguçando o medo. Medo do regresso. Medo da casa na aldeia jazigo de vivos dilacerados.Medo do olhar perdido no Marão ou na Estrela com a mente no mato ocre e castigador para onde um dia os mandaram.

No Verão de 1967, o esperado sucedeu. A patrulha de Avelino foi emboscada no mato, um furtivo lança granadas esfacelou o Barbosa, 19 anos, de Trancoso, vísceras dilaceradas, gritando esvaído. O PintO, perna atingida e osso exposto, rebolando com dores, os outros assustados a disparar para o vácuo, logo seguido do silêncio, a savana de volta à calma de todos os perigos. A evacuação foi lenta, o AVP-1 com interferências tardava a comunicar, o Barbosa já cadáver jazia, alvo, no chão do helicóptero o Pinto chorava sozinho, de dor e vergonha, que um homem não chora.

Retirados para Luanda, o corpo do  Barbosa foi velado no Quartel-General, toque aos mortos pela manhã, Avelino em continência, sangrando por dentro. O Pinto, amputada a perna e desmobilizado, partiu para a Metrópole, ao encontro das lágrimas da família, já choradas na partida em Alcântara, a Torre e Espada para o soldado mártir no 10 de Junho seguinte.

Pelo fim de 1969 Avelino finalmente voltou a casa. Depois da emboscada, cumprira o resto da comissão no hospital em Luanda, testemunha do lento estertor duma geração perdida numa guerra que não entendia mas que fazia deles homens, dizia a propaganda, exaltada em patrióticos  juramentos de bandeira país fora.Um olhar triste e perdido colou-se-lhe à cara nos anos que se seguiram.

Maio de 2010.No Aeroporto de Figo Maduro, o velho doutor Avelino Guedes e  a família acompanhavam a partida do neto João para o Afeganistão. Tenente do exército, oferecera-se para uma missão em Cabul, o velho C-130 aquecia já os motores para a partida a caminho de Camp Warehouse, integrado na IFOR. Apesar da movimentação talibã, os riscos eram calculados, o pior eram os suicidas, o Messenger asseguraria o contacto com Condeixa.Avelino, melancólico, recordava outros tempos mais dramáticos, a já distante partida de Alcântara e a guerra de capim contra um inimigo oculto, hoje lusófono e amigo, sinal dos tempos.

No hangar, militares e famílias trocavam os últimos beijos, abraços, fotos pelo telemóvel. A um canto, uma jovem alferes despedia-se também da família, um velho grisalho e enrugado destacando-se numa cadeira de rodas, perna amputada e olhar perdido. Com a emoção, o velho engasgou-se e começou a tossir,  minutos sem cessar, Avelino, médico, aproximou-se a oferecer ajuda. Não tomara os medicamentos, explicava a neta, quase a embarcar, amparando o avô.

Um olhar mais demorado e o velho Avelino reconheceu atrás das rugas o Pinto, estropiado na picada quarenta e três anos antes. O alferes Avelino e o soldado Pinto olharam-se e não evitaram um abraço, sentido e húmido, quarenta anos atrasado e arrancado a um livro de História já fechado.

O C-130 fechava as portas, os netos de ambos partiam agora, dois avós cúmplices os uniriam em Cabul. A vida dos  sobreviventes dum império esfumado no cais de Alcântara cruzava-se em nova partida, novo destino ancoradouro da alma. Uma guerra os separara, outra os reunia, já sós na pista ,o C-130 levantando nos céus de Lisboa.


publicado por Fernando Morais Gomes às 11:53

26
Jan 11

Rodrigo Fernandes acelerava em direcção ao ministério, a manhã fria e alguns minutos de atraso provocavam já mossa no  saldo de horas, o sistema biométrico da assiduidade a denunciar, irritante. Licenciado em Relações Internacionais, o pai arranjara-lhe emprego no Ministério da Agricultura onde o serviço não apertava e os cortes nos programas  deixavam  ocioso  parte do dia,  tudo decidido em Bruxelas. Nas muitas horas vagas  jogava Farmville, a única quinta onde  lidava com porcos e vacas sem suportar agricultores boçais atrás de subsídios, fosse pela seca ou pela cheia.

Naquela manhã, para variar, havia a pressa dum relatório para o ministro, a  Oposição no Parlamento com a perspectiva de eleições  esgrimia o argumento das quotas de leite , milhares de litros desperdiçados  nos Açores  para cumprimento da PAC.Um escândalo, gritava teatral um deputado que nunca vira uma vaca mas a quem o patriotismo das pastagens motivava shakesperianas tiradas no hemiciclo, sublinhadas pelos “muito bem!” de correligionários ensaiados.

Rodrigo ,maçado, lá colidiu as informações solicitadas, ao menos fazia qualquer coisa.Com sorte escapara ao corte no vencimento, aumento de 10% em Novembro, de onde agora cortavam 4%, o ministro fora colega do pai no Colégio Militar, é assim que se vêm os amigos.Imprimindo o árido relatório, barras de explorações e gráficos de leite , suspirava por um lugar numa embaixada, Paris ou Roma,onde pudesse fazer outras coisas e viver o perfume da civilização, longe daquele sonolento gabinete no centro de Lisboa, o café mais próximo vendendo chamuças oleosas e bolos de arroz com quinze dias.

O telefone interno tocou entretanto, o ministro chamava-o, briefing para ensaiar o discurso, havia que dar ar de competência e domínio dos dossiês na intervenção da tarde,  os números davam argumentos à oposição e havia que dourar a pílula, alegar qualquer coisa. A ver se não demorava ,  marcara uma massagem no Holmes Place às 18h e queria despachar cedo a questão das vacas .

Rodrigo, subserviente, clamava pela má-fé da Oposição, ingratos, não reconheciam o árido  trabalho em prol dos agricultores que se produzia naquele ministério, todos os dias  fazendo o IC19  para  com denodo salvar a pecuária nacional. Sobre as quotas do leite aventou uma ideia:

-Senhor ministro, há hipótese de dar uma interpretação diferente aos números da campanha do leite…

-Sim?...Diga diga, Rodrigo, sou todo ouvidos.

-É assim: Bruxelas fixou uma quota de 4 milhões de litros para a campanha de 2010, e os produtores durante a campanha obtiveram 5,5 milhões não é?..-foi avançando, nunca vira uma vasilha de leite, mas os números bastavam.

-Sim, e pelas regras da PAC temos de eliminar do circuito esse leite, não pode ser comercializado, senão  pagam-se pesadas multas.

Rodrigo, ar matreiro e já iniciado em manobras políticas na secção de Alfragide gizou um plano:

-Sugeria uma coisa: por um lado rectificar as estatísticas, anunciando que não era em litros de leite mas em número de recipientes que os números estavam a ser contabilizados, e notificar já o EUROSTAT,.Aliás, temos lá o Bernardo, que  é do partido, pode dar uma ajuda; e por outro atirar a responsabilidade do descontrolo para o governo regional. Os tipos não se puseram de fora neste assunto dos vencimentos? Pois agora chuta-se a bola para o lado deles, que se amanhem. E no Parlamento o senhor ministro pode ainda contra atacar com uma linha de crédito para os agricultores do Oeste e assim calam-se já os detractores…

O ministro rejubilava, boa cartada:

-Excelente, Rodrigo, ainda bem que o tenho cá no ministério. Olga, prepare já um despacho anunciando uma linha de crédito, o Rodrigo dita o que for preciso. Depois, daqui a dois meses suprime-se e alega-se que o PEC 4 exige mais sacrifícios ao país…

Rodrigo sorria, ufano, como é que ainda não estava em Paris a passear no Boulevard des Italiens e a servir o país num gabinete da embaixada.

Durante a tarde, o ministro lá colocou o ar de responsável sem horas de sono e em prol da pecuária nacional e o debate foi levado para os apoios e a linha de crédito, aplaudida de pé pela bancada do Governo.

Oito dias depois, já Rodrigo arrumava o carro no parque fronteiro ao ministério, o telemóvel tocava, o ministro queria falar-lhe, a voz séria sugeria urgência. Pensou que a história do leite se calhar azedara e com a calma possível acelerou o passo. No gabinete, o ministro, bem disposto, saudou-o cordialmente, oferecendo café. Eram boas notícias: o Governo reconhecia a extraordinária preparação de Rodrigo em assuntos agrícolas e os seus conhecimentos do mundo rural e nomeava-o  Secretário de Estado da Agricultura, a posse seria dois dias depois, saudava, abraçando o novo e promissor governante.

Rodrigo depois do pasmo rejubilou, à tarde muito saudado no Pavilhão Chinês pelos amigos de outros gabinetes. Afinal, perorava saboreando um martini, a agricultura era o futuro do país, ecológica e sustentável, com espírito de missão cumpriria o lugar e as  deslocações a Bruxelas para as maçadoras reuniões quinzenais.Enquanto os restaurantes da Grand Place mantivessem o cardápio de vinho e queijos a tudo se sacrificaria em prol do país e da lavoura.


publicado por Fernando Morais Gomes às 11:14

25
Jan 11

Lagos, Estio de 1445.O sol escaldante de Agosto desaconselhava grandes caminhadas mas D. Henrique não dispensava o passeio pelo areal. Três naus de Gonçalo de Sintra regressavam de Arguim  carregadas  de goma laca, pó de ouro e escravos e divertia-o o alarido ruidoso dos homens em terra e das mulheres ansiosas, carpindo e rezando no cais. Desde que as velas de Cristo  passaram a sul do Bojador que os negócios  prosperavam e em terras do Mali haviam embarcado dezenas de cativos, capturados por régulos  de Tumbuctu. Nuno Tristão e Antão Gonçalves porfiavam na empresa mercantil e enquanto caminhava na praia pensava como ajuizada fora a aposta na navegação para sul do Cabo Branco, agora alargada  a Arguim.

D. Henrique contava já 51 castos anos, as mulheres não o atraíam,não casara e só os negócios do mar  e os seus  mareantes o distraíam, longe da corte e do sobrinho rei, infeliz  jovem rodeado de intriguistas cortesãos. Aquele sul bafejado pelo suão, o cheiro a peixe e goma  nos mercados de Lagos e Portimão eram o seu mundo privado, bálsamo da alma atormentada.

Arguim, ilha a sul do grande Saara  e de  água doce brotando das areias, como entusiasmado relatara Gonçalo ao voltar, uma légua de largo e duas de longo com bancos de areia e recifes era a mais recente descoberta. D. Henrique tentara já atrair comércio do noroeste africano para o Rio do Ouro, tendo cabido a João Fernandes concretizar esses planos. Gonçalo acrescentava agora novo domínio à Ordem de Cristo, enquanto em Veneza Fra Mauro  trabalhava  numa  carta que facilitasse a orientação das naus,  à medida que o Mar Oceano se tornava num imenso lago português.

Lagos nesses dias fervilhava de navios e mercadores, marranos de Lisboa e Évora, flamengos de Bruges, pela tarde fariam o trato da goma e dos escravos, uma vintena de peças com boa dentadura, as fêmeas parideiras depressa reproduzidas. D. Henrique, cavalgando a sua égua inspeccionou a mercadoria, um negro mais alto e musculado  atraiu-lhe a atenção. Sempre mais interessado nos  machos que nas fêmeas, possuía vários espécimes que, diziam serviçais da sua casa, frequentemente acediam aos seus aposentos durante a noite, após o que frequentemente se ouvia o ruído lancinante dum chicote flagelando o próprio corpo, para expelir o pecado, aventava Domingas Vaz, a velha cozinheira, benzendo-se.Gonçalo de Sintra acompanhava-o ,enquanto o feitor, Telmo da Gama, destinava alguns escravos para o Duque de Beja, a goma laca seguiria para Lisboa e Setúbal. Gonçalo era seu protegido, íntimo da casa de Lagos e frequente acompanhante nas deslocações à Côrte, antes de D. Duarte se finar  levara mesmo o seu amo a conhecer as frescas terras de Sintra onde nascera, sempre bafejado por mercês do Infante protector. D.Henrique apontou-lhe o escravo negro,  pedindo opinião.,era escuro como um tição, olhar temível, hirto de ódio, agrilhoado, com desprezo olhando os captores. Das carnes desnudadas sobressaíam as vergonhas, pujantes, bom reprodutor por certo, ruminava o Infante. Gonçalo apreciava-lhe a desenvoltura e D. Henrique  mandou separá-lo e  mais duas pretas já prenhas. As crias renderiam bom dinheiro, depois de parirem ,uma carroça  carregou-os a caminho de  casa onde Adahu saberia o que fazer com eles.

Adahu, velho tuaregue ao serviço de D. Henrique, fora um escravo capturado em Tumbuctu. Chegara-se a pensar possuir informações sobre o reino do Prestes João mas era falso, D. Henrique ainda assim, achando-o sábio  depois de o mandar açoitar por mentiroso manteve-o ao seu serviço. Como mais velho tinha ascendência sobre os recém-chegados e o  seu chicote de boas vindas não deixaria de comemorar a chegada de novos braços, os mais fortes destinados à construção das naus, os de pele mais fina para o serviço doméstico, sendo os mais formosos para vestir e banhar a seu amo antes da missa ou novena na igreja matriz.

Já caída a noite, depois da  visita às naus e da ruidosa arenga no mercado dos escravos, regressava satisfeito à casa chã e senhorial, onde Domingas, instruída para não incomodar, deixara na mesa uma malga com leite de cabra e meio pão de centeio. Depois das orações,  com  o horizonte azul recortado pelas velas de Cristo e o pôr do sol tardio prenunciando novo e cálido dia, o Navegador recolhia ao quarto onde o tição negro  o aguardava, para satisfazer as vontades de seu senhor.


publicado por Fernando Morais Gomes às 10:55

24
Jan 11

Manhã de Dezembro, a fria aragem matinal de Sintra aconselhava agasalhos, com a crise a marcar as conversas e as presidenciais a encher as televisões .Com o frio, a fila do centro de emprego não tinha mais de trinta pessoas e a loja chinesa colocara uma banca de cachecóis  saliente à entrada. Bruno Giestas como habitualmente dirigia-se para o banco, telefonemas e reuniões, em Março mudaria para o balcão do Cacém. Pouco depois das nove, um Peugeot vermelho estacionou à porta e de lá saíram dois jovens, passa-montanhas na cabeça e roupa em desalinho ,postando-se alguns minutos a sussurrar junto à caixa do multibanco, sem a utilizar. Bruno começou a achar a situação irritante, clientes  queriam usar a máquina e desistiam, achou por bem fazer um reparo, assegurava sozinho o serviço, a Marta fora ao café. Mal abriu a boca, um sacou de uma seringa e ameaçador mandou que passasse o dinheiro da caixa para um saco que levava dobrado.Ainda tentou dialogar, mas  o outro arrastou-o para um canto e amarrou-o , longe da vidraça que dava para a rua, sacando todas as notas à vista, mais de  vinte mil euros e fugindo depois à pressa, que chegava um cliente e não convinham testemunhas. Ainda amarrado e com o coração acelerado, tentou registar as caras dos ladrões, um moreno e magro,aí vinte e cinco anos, brinco na orelha direita, o outro mais familiar, da Portela talvez, aparentava dezoito anos, cabelo ruço e olhos verdes.Depois de desamarrado  ainda correu para a porta, mas já o Peugeot sumia veloz na direcção da Vila. A GNR tomou conta da ocorrência e Bruno retomou a rotina, não sem que nos dias seguintes várias vezes relatasse o seu primeiro assalto em dez anos de banca, como os havia enfrentado sem medo, um murro certeiro nos dentes de um, se não fosse serem dois…

Semanas mais tarde, de novo num dia frio e invernoso,  novo stock de gorros a três euros na loja chinesa, os jornais anunciavam que os mercados continuavam a pressionar a dívida,o PSI-20 débil, até as acções do BNES desvalorizavam.Uma torrada e uma meia de leite  e começava mais uma semana para Bruno. Desde o assalto ,a videovigilância fora reforçada, e pelo sim pelo não adquirira um spray de gás pimenta, religiosamente guardado na gaveta direita. A filha fazia anos e ainda faltava a prenda, pedira um Ipad mas ainda eram caros, uma roupa na Zara e o jantar no chinês de S. Pedro com a família e amigos selariam os dezassete anos da Mafalda.

À noite, pouco passava das oito, os amigos dela iam chegando. O Jaime, filho do Borges da seguradora de Lourel, as amigas do voleibol, o Toni,agora  DJ na discoteca da praia. E um novo, que não conhecia, o Marco, atrasado, roupa sóbria e ar franzino, um peluche de prenda para a Mafalda e abraços fraternos aos amigos, a Bruno um  cumprimento respeitoso, pai de amiga oblige. depois de sentados, com a conversa a ficar solta e Marco mesmo frente a si, Bruno começou a descobrir familiaridade naquele rosto, asseado e pacato,quase tinha a certeza de haver visto aquela cara antes e meteu conversa:

-Então ,és colega da minha filha?

-Sim, andamos na Portela, em Santa Maria, na mesma turma.

-O Marco é um querido, pai, aliás é o melhor aluno do 12º lá da escola- interrompeu Mafalda, algo mais que simples colega a  escapar no tom de voz, olhar cúmplice na sua direcção.

-Muito bem…Ia jurar que te conhecia de algum lado.. mas está bem, se calhar é do banco, entra lá muita gente, chega-se a uma altura em que julgamos conhecer toda a gente…

-O senhor trabalha num banco?Qual?

-O BNES,de Sintra, costumas lá ir? Se calhar o teu pai… Até foi assaltado o mês passado, não ouviste falar?

Marco não recordava  e ficou em silêncio mas passados momentos saiu para ir à casa de banho. Dez minutos depois, o telefone de Mafalda tocava e do outro lado  o amigo alegava uma chamada da mãe, sentira-se mal e tivera de sair às pressas, pedia desculpa, Mafalda, tristonha, alegava compreender.Bruno, atento, sondou-a:

-Algum problema, Mafaldinha?

-Era o Marco,pai, a mãe dele adoeceu de repente e teve de sair. Espero que não seja nada de grave, as coisas estão a correr-lhe bem agora, até lhe saiu o totoloto o mês passado, pagou  uma rodada no Maçãs à malta toda...

-Saiu-lhe o totoloto? E foi coisa que se veja?

-Foram vinte mil euros, altamente, mas ele tinha jogado a meias, mesmo assim ainda foram dez mil .

De repente fez-se  luz no cérebro de Bruno: a cara familiar, vinte mil euros, o tal do Marco só podia ser um dos assaltantes do BNES, agora bem vestido e com ar de sonso. Sem levantar suspeitas foi tirando nabos da púcara, os restantes colegas já animados acompanhando os noddles de camarão com um tinto espirituoso:

-E sabes o que ele pretende fazer com esse dinheiro todo?

-Vou-te contar uma coisa, pai, mas promete-me que não ficas zangado. Eu e o Marco  curtimo-nos bué.Ele é muito fixe,quando o conheceres melhor vais ver, o dinheiro é para pagar os estudos, coitado, tem média para entrar em medicina mas o pai está desempregado, a mãe é epiléptica…- foi explicando, entusiasmo na voz.

Bruno embatucou, desconfiado . Nos dias seguintes seguiu-os de carro à saída das aulas,felizes e descontraídos a caminho do Académico ou do autocarro, jovens com sonhos apanhados nos dias  cinzentos dum Portugal de chumbo. Aos poucos esqueceu a história do assalto, o seguro do banco cobrira o prejuízo, à polícia lá foi adiantando não lembrar pormenores dos assaltantes. Um genro médico e a felicidade da filha valiam mais  que isso tudo e afinal até podia não ter sido ele, concluiu, rotina do banco retomada, o gás pimenta à cautela ao lado.


publicado por Fernando Morais Gomes às 11:30

21
Jan 11

Arredores de Zamora, 3 de Outubro de 1143.A comitiva do  enviado papal,seis pessoas em liteiras e mulas vagarosas,  enfrentava dificuldade em chegar à cidade, o cardeal Guido de Vico acometido de tosse maldizia a missão que o Santo Padre lhe confiara,  mediar em Leão o conflito entre o Imperador das Hespanhas, Afonso VII e o insurgente terra tenente portucalense, o impulsivo Afonso Henriques, seu primo. A noite caía, acolher-se-iam na  vila de Toro, um vinho reconfortante e uma lebre com feijão alimentariam o corpo, que a alma já o estava pela entrega a Deus.

Perto da estalagem, um grupo de três cavaleiros aguardava a embaixada, não pareciam homens do Imperador , comentara Giacomo Alighieri, chefe da guarda do cardeal-diácono, as  montadas estavam agitadas e ofegantes, sinal de uma viagem porventura longa e recente. Giacomo adiantou-se e depois de troca de palavras com os forasteiros voltou a informar o velho cardeal:

-Eminência, são cavaleiros portucalenses, alegam ter urgência em falar-vos antes que vos encontreis com o Imperador amanhã.

O cardeal , agastado,anuiu, que esperassem na estalagem, depois de se refrescar e do descanso lhes falaria.

Três horas mais tarde, devidamente paramentado, o cardeal  enfim recebeu os estranhos visitantes, beija -mão respeitoso com genuflexão em silêncio.

-Dominus Vobiscum, o Senhor esteja convosco!- abençoou-Pois diz-me o meu chefe da guarda que sois portucalenses. Que mister vos trás ao meu caminho?Amanhã mesmo estarei em Zamora, não poderíeis esperar até lá?- ralhou paternal, logo sacando duma taça de vinho de La Rioja, o cardeal  Diego de Molina, da Cúria, recomendara-lho antes de partir de Roma.

-Eminência, deixai que nos apresentemos - adiantou-se o mais velho -o meu nome é Egas Moniz, senhor de Ribadouro, nas terras de Sousa e vosso criado, comigo viajam Gonçalo e Soeiro Mendes da Maia, da casa dos Baiões- apontou, logo todos saudando o prelado - Traz-nos até vós a necessidade de que antes que o vosso sábio juízo se debruce sobre os conflitos que trazem em agrura nosso senhor D.Afonso e o Imperador estejais de posse de factos secretos que  podem ajudar a entender a rebeldia de D.Afonso, não produto de imprudência viril ou teimosa, mas assente em factos terríveis até hoje mantidos em segredo - concluiu, teatral, o cardeal intrigado bebendo mais um cálice.

-Pois que factos tão misteriosos são esses, cavaleiros? Dizei ao que vindes!

-Eminência, escutai com atenção: há setenta e dois anos, o falecido avô do Imperador, El-Rei Afonso VI e  D. Sancho, seu irmão, lutavam em disputa pelo Reino de seu pai Fernando Magno . Mas , corria o ano do Senhor de 1071 D.Sancho foi misteriosamente  assassinado e alegadamente sem deixar herdeiro , o que permitiu ao  irmão, o Senhor D.Afonso VI ocupar o trono que hoje é de seu neto.

-Sim, sim, todos sabemos disso, D.Egas, se são histórias que me vindes contar…..

-Não, Eminência. É aqui que a verdade se deve sobrepor, e assim compreender porque D.Afonso Henriques não aceita seu primo como rei e senhor- adiantou, os outros com ar grave, anuíam com a cabeça - É que D.Sancho não foi assassinado por um nobre de Castela, como se fez soar, antes morreu às ordens de seu avô,D. Afonso, bem como o seu filho varão  D. Pelayo,cujo nascimento agora se nega, pelo que El-Rei Afonso VI  foi  sagaz usurpador aos olhos de  Deus , assim o sendo também o Imperador , maculado pela desonra do avô!

O cardeal pasmava, logo clamando por provas de tão graves acusações:

-Medis bem o que dizeis, cavaleiros? O que tendes para me provar tão torpe acusação?

Egas Moniz sacou um pergaminho dum bornal que trazia a tiracolo, e exibiu um texto escrito  a sangue pelo  malogrado  D.Sancho, que à hora da morte, envenenado, ainda teve forças para acusar o irmão da sua perdição e de seu filho. A chancela e armas de Leão não deixavam dúvidas sobre a autenticidade do documento, levado para Guimarães por um aio fiel,Beltan Gutierrez, e entregue para mais de cinquenta anos ao arcebispo de Braga.

O cardeal pareceu transtornado e questionou os cavaleiros sobre as suas intenções.

-Eminência- salientou Egas Moniz- sabemos que a vossa missão é apartar os reais primos de querelas em torno de seus domínios. Pois bem: convencei com a vossa palavra avisada o Imperador de que deve reconhecer os direitos de seu primo  D.Afonso e este documento sumirá para sempre nas águas do Duero, assim se sossegando os reinos vizinhos e em paz.

Guido de Vico nada disse e recolheu-se, taciturno. No dia seguinte pela manhã, depois de celebrar missa em Zamora, reuniu a sós com o Imperador Afonso VII. Da reunião na catedral nada transpirou, serviçais apenas notaram que o Imperador estava possesso, tendo mesmo quebrado uma mesa praguejando em voz alta quando voltou ao castelo. Pela tarde, à hora das vésperas o pretendente português, Afonso Henriques e seus partidários chegavam ruidosamente a Zamora, acompanhados do arcebispo de Braga, D. João Peculiar, juntando-se-lhes então Egas Moniz e os Mendes da Maia. A presença dos portucalenses causava   estranheza na cidade sobre os propósitos da viagem, temendo-se por escaramuças durante o torneio que ia começar nesse dia, o vinho e a cidra correndo em abundância  nas tabernas com a chegada de cavaleiros para os jogos.

Na tarde de 5 de Outubro, visivelmente incomodado, e na presença silenciosa do cardeal, Afonso VII e o primo acordavam que o Condado Portucalense se chamasse reino e Afonso Henriques rex, deixando os cortesãos intrigados com a rapidez com que o Imperador anuíra às pretensões do primo depois de anos de bravatas.

Dias mais tarde, e com a promessa de uma tença para o Santo Padre , fiel depositário de um segredo  soturno que só a ele transmitiria, o cardeal Guido de Vico volvia a Roma, não sem antes mandar carregar uma pipa de vinho de La Rioja que o cardeal Molina tanto elogiara. No Duero, diluíam-se já corrente abaixo as cinzas dum  velho pergaminho.


publicado por Fernando Morais Gomes às 21:20

O grupo de sindicalistas aguardava no exterior da residência oficial do primeiro-ministro, os cortes salariais na função pública e nos direitos sociais no cerne dos protestos. Duarte Madureira, do Sindicato da Administração Local e delegado sindical em Sintra integrava a comitiva, dois plenários haviam reunido mais de duzentos participantes, o maior em vários anos, a explosão social latente com o apertar do cinto criava terreno fértil ao descontentamento.

Em Sintra, Duarte trabalhava no  núcleo de fiscalização dos SMAS. Cinquenta e dois anos, um percurso político coerente desde que aos dezasseis anos e aluno de liceu participara nas primeiras reuniões gerais de alunos que culminaram na federação de Lisboa de estudantes do ensino secundário. Passara pelas vigílias no Ministério da Educação, guardadas por militares do COPCON em 75, as greves estudantis, conheceu a primeira companheira  numa manif na 5 de Outubro, juntos entraram em Letras depois, o empenho na associação académica levou a que nunca concluísse o curso. Mais tarde passou pela Sorefame, como escriturário e delegado sindical, desde 1993 que trabalhava nos SMAS de Sintra, sindicalista militante. Os cabelos desalinhados e a barba hirsuta dos generosos anos setenta foram entretanto dando lugar a uma coroa grisalha tapando a careca, um segundo casamento com uma camarada de Almada acalmara sem matar a rebeldia da juventude. Os tempos eram outros, Abril cada vez mais distante, os cravos ,simbólicos, apenas nos rituais 25 de Abril.

Na antecâmara de S.Bento juntavam-se agora vários dirigentes, todos com anos de sindicalismo, o grosso nas fileiras da CGTP, os técnicos superiores penalizados também associados contra o funeral da classe média, reiterava Ramiro Simeão, jurista do Ministério da Agricultura com um corte de 10% a acicatar o protesto.

Como o primeiro -ministro não estava, foram encaminhados para uma sala onde dois assessores engravatados os receberam, ar protocolar e formal, telemóvel na mão sempre a tocar. O documento foi entregue com promessas de encaminhamento e  não durou mais de sete minutos, cumprimentos um a um na despedida junto à escadaria, para as televisões.Quando chegou a vez de Duarte, cumprimentado o chefe de gabinete, já apaticamente estendia a mão sem entusiasmo ao outro assessor, quando sentiu a mão deste apertar a sua com força e com um olhar subitamente vivo e expressivo chamá-lo pelo nome:

-Duarte! Há quantos anos! - o assessor engravatado e até ali circunspecto saía do pedestal cerimonioso,com os demais olhando desconfiados para aquela inesperada cumplicidade com o poder.

Duarte fixou os olhos no interlocutor, e por trás do fato Armani e dos óculos reconheceu Pedro Lavrador, colega dos anos de Letras, ele próprio compagnon de route das reuniões inter-associações no fim dos anos setenta. Surpreso e agradado pelo reencontro, mas receoso dos comentários sobre aquele conluio com a burguesia, cumprimentou-o com um leve sorriso, logo um convite dele para um café ali perto de S.Bento para matar saudades.

Mais de trinta anos haviam passado, de repente o som distante das marchas revolucionárias e dos amanhãs que cantam que os fizeram cúmplices nos anos da revolução sentava-os em torno duma mesa, aparentemente em barricadas diferentes. Portugal mudara muito e agora ,no fio da navalha da crise, esbracejava acossado pelos mercados.

-Mas conta-me, Duarte, que é feito de ti? E a Susana?

-Já não estou com ela, separámo-nos em 86, agora tenho outra companheira. Estou em Sintra, nos SMAS, sou lá delegado sindical. E tu? Que  fazes aqui neste ninho de lacraus?

-É uma longa história, velho amigo. Quando tu desististe de Letras, conclui o curso e dei aulas em Alverca, casei. Tenho um filho com 26 anos, já arquitecto, sabias?- explicou entusiasmado, sacando de uma foto de família, junto à piscina em Vilamoura -Depois quando foi da adesão à CEE concorri para um lugar de tradutor e fui para Bruxelas, dez anos cá  e lá…

Apesar do fato e da pose tecnocrática, Duarte por trás da fachada reconhecia ainda o velho Pedro, grande cantor nas sessões de canto livre com o Adriano , sacola a tiracolo e cabelos compridos  pastosos por falta de lavagem que a água enfraquecia a pele, dizia na altura, um  cachecol cinza  grosso feito pela avó, outra encarnação, fantasma do tempo.

-Há sete anos passei a integrar um núcleo de apoio diplomático, e agora estou aqui destacado. É um trabalho exigente, mas gosto do que faço!- explicou, o passado  sépia abafado pelos toques do Blackberry.

-E ainda és de esquerda? -lançou Duarte, curioso, muitas desilusões mas fiel aos velhos ideais, apesar do  desprendimento dos mais novos que no serviço até gostavam do cota esquerdista.

Pedro sorriu, pediu mais um café, Duarte recusou, a diabetes desaconselhava, e cúmplice abriu-se com o velho amigo:

-Meu velho, esquerda e direita são coisas que já não contam nos dias de hoje. O mundo mudou , até a surda muda… gracejou, pagando as bicas com o cartão do Gabinete -E sabes: quem não é revolucionário aos vinte anos, é porque não tem coração. Quem é revolucionário aos quarenta é porque não tem cabeça…- e levantou-se apressado, o chefe de gabinete chamava por ele, tinha havido uns desacatos com polícias à saída da delegação dos sindicatos.

Depois da troca de números de telefone, Duarte a sós desceu a D.Carlos I e deteve-se junto ao Tejo ,a Lisnave ao fundo lembrando lutas de outros tempos. Na televisão dum bar junto ao rio, um ministro de ar grave garantia que o Estado Social nunca seria destruído…


publicado por Fernando Morais Gomes às 07:50

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